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Natureza honra extrativismo do pinhão

Agro

13 de abril de 2025

Natureza honra extrativismo do pinhão
Coleta de pinhão na propriedade Sítio do Mel, de Eraldo Antunes Coelho, na localidade Campestre do Tigre em São Francisco de Paula
Foto: Eraldo Antunes Coelho / Divulgação

Se você nunca assou na brasa, experimentou com farofa ou degustou cozido não imagina o que está perdendo. A semente comestível proveniente da Araucária Angustifolia combina com diversos tipos de preparos e sua colheita e comercialização teve início oficial em 1º de abril, conforme a lei nº 15.915, de 22 de dezembro de 2022. Estimativas iniciais projetam 860 toneladas do alimento no Rio Grande do Sul. Os municípios destaques na produção em 2025 são Muitos Capões com perspectiva de 110 toneladas e São Francisco de Paula e Jaquirana – cada um com 100 toneladas.
As informações são da engenheira Florestal e assessora Técnica da Emater/RS-Ascar, Adelaide Juvena Kegler Ramos, ao explicar que as estimativas são baseadas nos dados de produtores extrativistas e entidades representativas da atividade. Do total projetado para esse ano no Rio Grande do Sul, 600 toneladas devem ser colhidas nas regiões da Serra Gaúcha, compreendendo Hortênsias e Campos de Cima da Serra; Planalto, com outras 110 toneladas; e, Centro Serra e Serra do Botucaraí, juntas, com 150 toneladas.

“Com relação a produtividade, como nos anos anteriores, há uma grande variação em 2025. As estimativas iniciais da colheita na região da Serra, Hortênsia e Campos de Cima da Serra, onde temos uma aferição maior nos levantamentos, variam entre a manutenção dos índices da colheita do ano anterior e um crescimento na produção de 10% a 20% em alguns municípios. Em contrapartida, também há outros municípios nessa mesma região que verificamos a diminuição nesses mesmos índices de 10% a 20% na produção do pinhão”, detalhou.

Adelaide explica que as causas principais dessa oscilação de produção são a ocorrência de eventos climáticos no Rio Grande do Sul, como o estresse hídrico. “Estamos entrando no sexto ano consecutivo de períodos de estiagens. Por outro lado, também se verifica a ocorrência de chuvas abundantes e excessivas no final do inverno e início da primavera. São fatores que contribuem e interferem diretamente no processo de fecundação, de reprodução, de desenvolvimento e, claro, na produção do pinhão”, detalhou, acrescentando que isso impacta na quantidade e qualidade da semente comestível.
Além disso, dos extremos climáticos, a engenheira Florestal e assessora Técnica da Emater aponta a alternância natural da araucária para as projeções de colheita. “Sendo uma espécie nativa, ela tem produções cíclicas. Na média, se apresenta uma safra cheia a cada três anos. Nesse intervalo há oscilações de produtividade”, esclareceu.

Conforme Adelaide, em anos regulares o município de São Francisco de Paula é o maior produtor de pinhão do Rio Grande do Sul, título que, segundo ela, oficialmente ainda conserva. “Teria uma produção anual estimada em 120 toneladas. Para esse ano se vê uma produção de cerca de 100 toneladas. Em relação à safra anterior (2024) é um crescimento de 20% porém ainda abaixo da produção padrão desse município”, exemplificou, acrescentando que a atividade de coleta, extração e comercialização da semente comestível envolve em torno de 160 famílias agricultoras.

De acordo com a engenheira, no município de Muitos Capões são 70 famílias comprometidas com a cultura do pinhão, com produção estável para esse ano em relação ao ano passado. Em Jaquirana, envolve outras 150 famílias, que devem colher 20% a mais do que em 2024. Em contrapartida, em Cambará do Sul as 100 famílias agricultoras devem colher 20% a menos. No município de São José dos Ausentes as 90 famílias também têm perspectiva de redução, porém de 10%. Por fim, em Bom Jesus as 120 famílias devem manter os índices registrados no ano passado. Conforme Adelaide, no Rio Grande do Sul também é significativa a atividade nos municípios de Monte Alegre dos Campos, Pinhal da Serra, Esmeralda e Vacaria.

Sobre a colheita, a engenheira Florestal e assessora Técnica da Emater/RS-Ascar explana que no Rio Grande do Sul a data é definida por lei como forma de garantir que as pinhas estejam plenamente maduras, tendo começado o processo natural de debulha. A medida tem como objetivo conciliar a geração de renda da atividade com a proteção da araucária e todo o seu ecossistema associado, assegurando a fauna que depende desse tipo de floresta.

“A Lei nº 15.915 regulamenta, além da coleta, o transporte e a comercialização. Define que apenas os pinhões com característica de maturação, com estado decente, coloração verde, avermelhada ou marrom típica poderão ser colhidos”, acrescenta.

Adelaide reforça que a Araucária Angustifolia é uma espécie ameaçada de extinção e protegida pelo Decreto Estadual 52.109, de 2014, e também pela portaria do Ministério do Meio Ambiente, número 148, de 2022.

 Foto: leandro maciel

Árvores matriarcas seguem produzindo

Araucárias centenárias, no município de Coqueiros do Sul, com alturas de até 36 metros, desafiam o tempo e a perda de mata nativa

Em 2023, três Araucárias Angustifolia da Fazenda Coqueiros foram reconhecidas entre as maiores da espécie no Rio Grande do Sul. Cada uma tem 300 anos de idade, estimados, e, mesmo centenárias, seguem produzindo. A informação é do engenheiro agrônomo, Homero Guerra Neto, que atua na propriedade desde 1986 no regime de Parceria Agrícola com sua tia, Vera Guerra.

Da maior para a menor, as exemplares têm 5,67 metros, 5,55 metros e 5,18 metros de circunferência, além de alturas que variam de 30 a 36 metros, e foram premiadas no concurso “Árvores Gigantes do Planalto Médio do Rio Grande do Sul”, organizado por diversas entidades e apoiadores, que teve como objetivo identificar as maiores araucárias da região, a fim de valorizar a biodiversidade da flora nativa e incentivar a preservação ambiental.

A propriedade triplamente vencedora da edição, do primeiro ao terceiro lugar, está localizada no município de Coqueiros do Sul onde Guerra Neto administra uma gleba de terras de aproximadamente 600 hectares de lavouras, com uma enorme e diversificada reserva de Mata Atlântica e muitas outras espécies de árvores nativas, como cedros, angicos e caneleiras.
Conforme o engenheiro agrônomo e administrador, a preservação da mata e a história familiar são os pilares que sustentam esse legado natural. “A Araucária é tipo um dinossauro do reino vegetal, com espécies fêmea e macho. Uma espécie muito antiga no planeta, parente do cipreste”, explicou.

As exemplares na propriedade são fêmeas e Guerra Neto avalia que um estudo botânico provavelmente revelaria com mais exatidão que suas idades devem ser superiores aos 300 anos estimados.

“As árvores deixam marcas de seu crescimento, como uma criança”, acrescentou.
Guerra Neto destaca que, em torno de 80 a 100 anos atrás, houve o ciclo da madeira na região, antes dos campos serem transformados em lavouras. “As áreas férteis estavam nos matos e, naquela época, derrubavam as árvores mais grossas. Como fizeram no Mato Grosso há 30 anos”, explicou. “Nós temos uma reserva de mata nativa na fazenda Coqueiros que é um bem que não é nosso mas da humanidade. Estamos fazendo nosso dever de cuidar da flora e da fauna”, afirmou, ressaltando que essa postura teve início com o seu avô.

De acordo com o agrônomo, apesar de seguirem produzindo, há 10 anos a família vem observando uma queda na quantidade de pinhão proveniente das Araucárias da propriedade. “Acredito que é devido a um problema da própria fauna. O ciclo do pinhão leva dois anos até a pinha ficar madura e o que está acontecendo é que os pequenos primatas, como quatis, o macaco-prego e o macaco-aranha sobem nas araucárias e derrubam as pinhas ainda antes de amadurecerem, por causa da fome”, contou. “No fim acabam se prejudicando”, completou, destacando que não coleta a semente comestível nem para consumo próprio pois as considera necessárias para a fauna devido à escassez de alimento à medida que o outono avança e dá lugar para o inverno. “Os animais quando acham pinhão até guardam em suas tocas”, conclui, referindo-se aos roedores.

Araucárias da Fazenda Coqueiros, no município de Coqueiros do Sul, venceu a primeira, a segunda e a terceira colocação da edição realizada em 2023 do concurso "Árvores Gigantes do Planalto Médio do Rio Grande do Sul".As exemplares têm 5,67 metros, 5,55 metros e 5,18 metros de circunferência, além de alturas que variam de 30 a 36 metros. Cada uma tem, 300 anos estimados.

 Araucárias da Fazenda Coqueiros, no município de Coqueiros do Sul, venceu a primeira, a segunda e a terceira colocação da edição realizada em 2023 do concurso “Árvores Gigantes do Planalto Médio do Rio Grande do Sul”.As exemplares têm 5,67 metros, 5,55 metros e 5,18 metros de circunferência, além de alturas que variam de 30 a 36 metros. Cada uma tem, 300 anos estimados. | Foto: Jaime Martinez / UPF / Divulgação / CP

Volumes e preços variáveis na safra

A produção natural do pinhão também foi abalada pelos extremos climáticos que atingiram o Rio Grande do Sul nos últimos anos, com queda no desempenho das árvores e menor número de sementes para serem colhidas. É o que relata o agricultor Eraldo Antunes Coelho, proprietário do Sítio do Mel, na localidade de Campestre do Tigre, pertencente ao município de São Francisco de Paula.

Coelho estima que a redução na colheita do produto deve girar em torno dos 40%. Segundo o agricultor, a família costuma vender, anualmente, cerca de duas toneladas, a queda da colheita do pinhão está estimada em 40%.
“Nos anos anteriores aconteceu a estiagem e esse ano novamente, um pouco. Agora, bem tarde, começou a chover e teve pinhão que desenvolveu bem e outros que ficaram bem falhados”, desabafou.

Na questão da comercialização, a engenheira Florestal e assessora Técnica da Emater/RS-Ascar, Adelaide Juvena Kegler Ramos, destaca que o comunicado CONAB/MOC N.º 036, publicado em 31 de dezembro do ano passado, estabelece o preço mínimo a ser pago pelo pinhão extrativista, de R$ 4,45 o quilo na safra 2025. O valor é calculado com base no preço mínimo básico fixado pela portaria Nº 750 do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), de 24 de dezembro de 2024. “Esses são os preços oficiais”, sublinha.

Adelaide acrescenta que nas regiões coletoras os preços variam conforme a procura e a modalidade de comercialização, feita praticamente de forma informal e “in natura”, dentre as quais destacam-se a venda diretamente ao consumidor na propriedade extrativista. Nestes casos, o quilo do pinhão pode variar entre R$ 5,50 a R$ 6,50.

A engenheira Florestal e assessora Técnica da Emater/RS-Ascar destaca que também ocorre a venda direta com entregas nas residências do consumidor final, quando o preço do quilo pode variar de R$ 8,00 a R$ 16,00. Além disso, a semente é encontrada em supermercados, beira de estradas (em especial, na descida dos municípios da Serra em direção às outras regiões e à Capital), fruteiras e feiras livres entre R$ 12,00 a R$ 16,00 o quilo.

A engenheira Florestal e assessora Técnica da Emater/RS-Ascar evidencia que o consumo do pinhão é um produto ligado à nossa cultura e à tradição.

“Infelizmente, ainda há poucas iniciativas de beneficiamento da semente comestível, de industrialização e armazenamento. O que limita então a sua venda, principalmente aos meses de sua coleta, que se concentram entre abril e junho”, desabafou.

Adelaide finaliza acrescentando também que o pinhão cada vez mais está presente e tem relevância no turismo nos municípios de Gramado, Canela e Nova Petrópolis. A semente é muito aproveitada na gastronomia. “Outros municípios dos Campos de Cima da Serra, em geral, estão trabalhando e aproveitando o pinhão como um elemento ligado a cultura, tradição e a culinária, fortalecendo-o como um produto também na cadeia do turismo”, conclui.

Fonte: Correio do Povo