Acesso ao crédito definirá safra de verão no Rio Grande do Sul
21 de setembro de 2025

Restando pouco tempo para o início da semeadura de grãos de verão como soja e milho, o Rio Grande do Sul ainda tem muitas incertas quanto à produção e rentabilidade da safra 2025/2026. Os motivos para a indefinição são claros e passam pelo endividamento dos produtores rurais – que, segundo levantamento da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), considerando apenas as instituições financeiras que operam no Estado, chega a 27,4 bilhões – e pela demora e dificuldade de acesso a novos financiamentos para que o plantio acontece dentro do Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC).
A Medida Provisória anunciada pelo governo federal durante a 48ª Expointer prevê a liberação de R$ 12 bilhões para produtores rurais renegociarem dívidas oriundas de perdas com eventos climáticos recentes, como os anos sucessivos de enchentes ou estiagens vividos em solo gaúcho. De acordo com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a liberação ainda depende de uma regulamentação do Conselho Monetário Nacional (CMN). Os recursos são oriundos do superávit financeiro apurado em 31 de dezembro de 2024 de fontes supervisionadas por unidades do Ministério da Fazenda.
Para o economista-chefe da Farsul, Antônio da Luz, o tamanho da safra gaúcha dependerá de como as medidas anunciadas se mostrarão efetivas e em tempo de aliviar a situação dos agricultores endividados. Apesar disso, ele tem expectativa de que algo consiga ser colhido.
“Faz anos que a gente não consegue colher. São sucessivos problemas climáticos que têm levado a maior parte da nossa produção. Colher é o que a gente mais quer, mas o tamanho da área plantada vai depender da capacidade do acesso ao crédito. Saiu a medida provisória, mas ainda aguardamos uma resolução do Banco Central e uma circular do BNDES. Ainda está longe da resolução dos problemas”, disse o economista, para quem há um grau de incerteza muito grande sobre a safra de 2026.
Da Luz ressalta ainda o impacto que a demora na definição das ações de auxílio do governo federal teve sobre o setor. Ele aponta que foram mais de sete meses entre o início das conversas, em fevereiro, e a divulgação das medidas na abertura oficial da Expointer 2025. “Existe uma época certa para fazer o plantio. As plantas não podem esperar pela burocracia. Entre sair as resoluções, o produtor resolver sua vida no agente financeiro e comprar o insumo, levam dias. Isso não acontece do dia para a noite. Então, a safra 2026 está em aberto no Rio Grande do Sul”, completou.
A Farsul aponta ainda que alguns produtores que trabalham no cultivo do milho já iniciaram a fase de implantação das lavouras. Entretanto, são aqueles agricultores que já conseguiram, por conta própria, acessar o crédito para a safra. Ainda restam produtores que não sabem se conseguirão dar início à semeadura.
O mesmo vale para o cultivo na soja, que normalmente começa a ser plantada entre o final de setembro e início de outubro. “Não é uma tarefa fácil. Não temos condições de fazer estimativa de área plantada”, citou o economista.
O secretário estadual da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi), Edilvison Brum, embora reconheça as dificuldades da agropecuária gaúcha nos últimos anos, tem boas expectativas para a safra de grãos de verão. Brum considera em sua projeção um desempenho superior na produção em relação à safra passada, mas também pelas condições de mercado como por conta da previsão climática, que aponta, para uma primavera dentro da normalidade, algo decisivo para o desenvolvimento das culturas.
“Essa expectativa de recuperação traz alento ao produtor gaúcho, que enfrenta sucessivas dificuldades nas últimas safras, ora pela estiagem, ora pelo excesso de chuvas. Mais do que números, essa retomada representa a chance de fortalecer a economia do Rio Grande do Sul, já que a soja e o milho são pilares do agronegócio gaúcho, sustentando a geração de renda no campo, movimentando cadeias produtivas”, concluiu o secretário.
Clima e mercado indicam ciclo de sucesso
A consultoria Safras & Mercados estima que o Rio Grande do Sul possa realmente chegar a uma safra cheia no verão 2025/2026, com pequenos avanços nas áreas de plantio, perspectiva corroborada pela Emater

As estimativas da safra de verão 2025/2026 do Rio Grande do Sul foram divulgadas durante a Expointer 2025 pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater/RS-Ascar). De acordo com o órgão, deverá alcançar 35,3 milhões de toneladas, o que representa um crescimento de 27,30% em relação ao ciclo anterior. Além disso, o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola (LSPA) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que o Estado será o quarto maior produtor de grãos na safra de verão 2025/2026 no país, com 9,5% da produção nacional, atrás apenas de Mato Grosso (1º), Paraná (2º) e Goiás (3º).
Entre as principais culturas, a soja aparece como destaque, com estimativa de 21,4 milhões de toneladas, aumento de 57,14% em relação à safra passada, impulsionada por uma produtividade prevista de 3.180 quilos por hectare. A elevação de quase 60% se dá porque a base de comparação são as perdas nas safras em anos anteriores, em razão de condições climáticas desfavoráveis. O milho também apresenta avanço, com produção de 5,7 milhões de toneladas (+9,45%) em 785 mil hectares, alta de 9,31%. Para o diretor técnico da Emater/RS, Claudinei Baldissera, a soja e o milho devem puxar os resultados positivos. “São números importantes que, se confirmadas as condições climáticas, colocam o Estado numa posição de colher uma boa safra. O milho vem com aumento de quase 10% na área, em razão de vários fatores, inclusive programas de governo”, explicou.
Em todo o Brasil, a empresa de consultoria Safras & Mercado estima que a safra 2025/2026 da soja deverá romper a marca de 180 milhões de toneladas, representando uma elevação de 5,3% sobre a safra da temporada anterior, que ficou em 171,84 milhões de toneladas. Para o próximo ciclo, a estimativa da empresa é de uma produção de 180,92 milhões de toneladas. Em julho, a previsão apontava uma safra com cerca de 179,88 milhões de toneladas.
No Rio Grande do Sul, a aposta da Safras & Mercado é de recuperação e safra cheia, mas sem aumento de área.
“As revisões foram pequenas e, claro, que só o plantio e a colheita vão confirmar de fato a área plantada e a produtividade. Ainda assim, a expectativa segue de aumento de área, mas nada muito agressivo, até porque os custos estão mais altos e as dificuldades de financiamento podem limitar o uso de tecnologia”, aponta o analista e consultor Rafael Silveira.
Para a empresa, as exportações deverão totalizar 108 milhões de toneladas no país em 2026. Além disso, a consultoria estima que 59,5 milhões de toneladas de soja serão destinadas para esmagamento. A Safras & Mercado não aponta importação em 2026. “Já olhando para a safra nova, também é esperado um esmagamento forte, que reduz um pouco os estoques projetados. Mas, sem quebras de safra, o Brasil pode encerrar 2026 com estoques ainda maiores”, completou Silveira.
No Estado, a Emater aponta uma expectativa positiva, principalmente por conta do aumento da área do milho grão em 9,31%. A produtividade permanece estável, em torno de 7.376 quilos por hectare, ante 7.378 quilos. Já o milho silagem deve alcançar 14 milhões de toneladas, avanço de 8,29% frente a 2024/25, beneficiado por avanço de 5,28% na produtividade.
Clima Amigável
O meteorologista da Secretaria Estadual de Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi) e coordenador do Sistema de Monitoramento e Alertas Agroclimáticos (Simagro-RS), Flávio Varone, prevê que, depois de anos marcados por estiagens e enchentes, o próximo ciclo deve ter condições mais equilibradas. Depois de anos com influência dos fenômenos La Niña ou El Niño, a primavera e o verão deverão ter condições de neutralidade.
“As previsões são bem satisfatórias nesse sentido. Devemos ter um setembro dentro da normalidade, com chuva até acima da média, principalmente na metade norte. Previsão para outubro também é de chuva mais regular. Há uma previsão de resfriamento do pacífico equatorial. Essa condição deve trazer um final de primavera mais seco, principalmente em novembro e dezembro”, diz Varone.
Para a safra de verão, o meteorologista analisa que quem plantou milho mais cedo terá uma boa condição, com umidade suficiente para o desenvolvimento.
Varone cita ainda que, para o verão, a tendência é de normalidade, com tendência de retorno da chuva em janeiro e fevereiro. Essa condição é favorável para o desenvolvimento de grãos como a soja, o milho e o arroz. “Para culturas de verão como a soja, quem plantar um pouco mais tarde deverá ter uma condição melhor de desenvolvimento, mas vai ter que garantir a umidade do solo, com um cuidado maior em dezembro, que deve ser um mês mais seco”, completou.
Apesar disso, o meteorologista acredita que a neutralidade com relação aos fenômenos climáticos e o reflexo dela em uma previsão de normalidade no clima do Rio Grande do Sul deverá resultar em bons números. “Com condições boas de desenvolvimento, a safra deverá andar regularmente. Quem passar por dezembro e conseguir manter seu cultivo mesmo com diminuição da chuva terá um bom cenário”, encerra.
Arroz será plantado em área menor no Estado
A depreciação do preço do alimento, desde o ano passado, deve obrigar os produtores do Rio Grande do Sul a ajustarem a semeadura para a regulação do mercado, sem a interferência que tem ocorrido por parte da Conab

A Emater/RS-Ascar também divulgou estimativas da produção de arroz para a safra 2025/2026. Para o órgão, a cultura deverá registrar retração no próximo ano, conforme já havia sido anunciado pelo Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga). A produção para o ciclo 2025/2026 é estimada em 8 milhões de toneladas, com uma redução de 8,10% em comparação ao último ciclo, quando foram colhidas 8,76 milhões de toneladas de arroz no Rio Grande do Sul.
Isso acontece em função dos problemas que estão tomando conta do setor nos últimos meses, principalmente em virtude da depreciação do preço da saca do arroz. No último dia 15, a saca de 50 quilos do grão, de acordo com o índice do Cepea/Esalq/USP, esteve cotada em R$ 64,45. Na mesma data, em 2024, o preço da saca era de R$ 119,38. O achatamento da cotação, no decorrer de 2025, acabou por não cobrir os custos de produção dos agricultores. Em função disso, entidades como a Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) e a Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz) recomendaram aos orizicultores a redução da área dedicada ao grão.
“A meta para o Estado é de (redução de) 8% e para o restante do país 30% na área”, considerou o economista-chefe da Farsul, Antônio da Luz. Ele ressaltou que o Rio Grande do Sul concentra dois terços da produção nacional de arroz e que 2025 deve terminar com estoques altos do grão com grandes impactos de oferta excessiva em 2026. “Ainda dá tempo de desviar e evitar o excesso de oferta e preços em queda”, completou.
Em um primeiro momento, os municípios da Planície Costeira Externa do RS são os que demonstram maior intenção de diminuir a área de plantio. Neste sentido, a Federarroz protocolou pedido à presidência da República para adoção de medidas políticas e legais para garantir proteção à produção nacional de arroz. A solicitação foi encaminhada pelo presidente da entidade, Denis Dias Nunes. O objetivo do pedido é resguardar a orizicultura diante da “concorrência desleal com o cereal importado”, considerada predatória para o setor.
“Nossos agricultores enfrentam absoluta impossibilidade de competir com o produto estrangeiro, o que ameaça a continuidade da atividade e a própria segurança alimentar do país”, destacou o comunicado. Entre as medidas solicitadas pela Federarroz estão a aplicação de instrumentos de salvaguarda e a investigação de práticas de dumping social e ambiental. A nota adverte ainda que a situação colocará em risco a segurança alimentar do país.
Ainda de acordo com o Irga, a safra terá uma redução de 5,17% na área plantada, com previsão de semeadura de 920 mil hectares. No ciclo anterior, foram 970 mil hectares de arroz cultivados no RS. Apesar disso, mesmo com a produção de 8,7 milhões de toneladas, o instituto aponta que o volume gera excedente no mercado, uma vez que a formação do preço pago aos produtores segue a base da lei da oferta e demanda, influenciando para que, atualmente, os preços estejam abaixo do custo de produção, em média, na base dos R$ 95.
Por isso, o gerente da Extensão Rural (Dater) do Irga, Luiz Fernando Siqueira, explica que ainda é muito cedo para uma definição concreta sobre a previsão da safra.
“Inúmeros fatores influenciam o ano agrícola, sendo qualquer previsão de safra nesse momento uma irresponsabilidade que pode afetar diretamente o mercado. Agora, é o momento em que as entidades atuam no sentido de tentar regular o mercado interno, uma vez que o arroz é destinado ao mercado interno, e na última safra, tivemos um recorde de produtividade”, pontuou.
Entretanto, ao contrário das recomendações da Federarroz e da Farsul, o presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Edegar Pretto, tenta incentivar produtores rurais que trabalham com arroz a investirem na próxima safra. Na Expointer 2025, Pretto anunciou R$ 300 milhões para futuras operações de Contratos de Opção de Vendas (COV), como forma de enfrentar a queda no preço do grão no país.
Conforme o presidente da estatal, com os recursos o governo federal buscará garantir preços até R$ 20,00 acima da média atual do mercado. Este valor, segundo manifestações das federações, não cobre o custo da produção das lavouras. Pretto reforçou ainda a tentativa do governo federal de prospectar o mercado mexicano para a comercialização do arroz brasileiro.
A atuação estatal no setor foi criticada pelo presidente da Farsul, Gedeão Pereira. “Não é a Conab que vai resolver (a situação do preço do arroz). Quem tem que resolver é o mercado. Porque se vocês empilharem arroz no governo, vocês vão controlar o preço ad aeternum e vão desestimular a lavoura de arroz. É preferível deixar que o mercado resolva. Porque se tiver de diminuir as lavouras de arroz, nós vamos fazer para que o mercado corrija”, contrapôs o dirigente.
Fonte: Correio do Povo