Café moído tem primeira queda em 18 meses, mas especialistas alertam: “Alívio pode não durar”
15 de agosto de 2025

Pela primeira vez em um ano e meio, o preço do café moído registrou queda no Brasil. Segundo dados do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), divulgados pelo IBGE na terça-feira (12), o valor caiu mais de 1% em julho.
O recuo é uma boa notícia para os consumidores, especialmente para os apaixonados por café, mas ainda não é suficiente para compensar a disparada dos últimos meses. No acumulado de 2024, o produto já subiu 41,46%, e nos últimos 12 meses o aumento é ainda mais expressivo: 70,51%. Entre todos os itens monitorados pelo índice, o café foi o que apresentou a maior alta no período.
A queda ocorre em meio a um cenário delicado para a indústria, que ficou de fora da lista de produtos isentos da tarifa de 50% anunciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no início de agosto. Mesmo assim, especialistas descartam ligação direta entre os dois fatos. Isso porque o tarifaço passou a valer em 6 de agosto, enquanto os números do IBGE se referem a julho.
De acordo com Pavel Cardoso, presidente da Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café), a redução nos preços é reflexo, principalmente, da melhora nas safras brasileiras de café arábica e robusta no primeiro trimestre. Com maior produtividade — ou seja, mais grãos por área plantada — o preço ao produtor começou a cair a partir de abril. O efeito, no entanto, só chega ao consumidor após todo o processo de colheita, secagem, beneficiamento, torrefação, embalagem e transporte, o que leva de três a quatro meses.
O economista Matheus Dias, do FGV/Ibre, acrescenta que outro fator determinante foi a saída de fundos não-comerciais que, no ano passado, ajudaram a elevar as cotações. Esses investidores, que apostam na alta ou na queda de commodities, decidiram desmontar suas posições diante das previsões positivas para a produção. “A entrada de fundos eleva os preços, a saída contribui para a queda”, explica Dias. Além disso, a própria elevação dos preços ao longo do último ano reduziu a demanda, colaborando para a retração recente.
Para os próximos meses, o impacto das tarifas americanas ainda é incerto. Cardoso acredita que, caso não haja renegociação, haverá um desarranjo no mercado internacional. Segundo ele, a indústria dos Estados Unidos pode buscar café no Vietnã ou em países da América Central, como a Colômbia, o que afetaria contratos já firmados e traria volatilidade aos preços. Ele também lembra que os estoques mundiais estão historicamente baixos e prevê que a safra de 2025 seja menor que a de 2024.
Outro ponto a ser observado é o consumo crescente de café na China, que disparou nos últimos dez anos. O Brasil vem ganhando espaço como fornecedor para o país asiático, mas o volume ainda é pequeno se comparado aos Estados Unidos: em 2024, os norte-americanos importaram 8 milhões de sacas, contra menos de 1 milhão comprada pelos chineses. Ainda assim, a China pode absorver parte da demanda global ou até triangular negócios, comprando o grão, industrializando e revendendo aos EUA.
Enquanto o mercado observa os próximos movimentos, Dias acredita que, a depender do avanço das safras, há espaço para novas quedas nos preços no Brasil — embora tudo dependa de fatores naturais, como clima, qualidade do solo e controle de pragas. Já Felippe Serigati, coordenador do mestrado em Agronegócio do FGV Agro, pondera que a redução no custo da matéria-prima nem sempre chega ao bolso do consumidor. Ele compara ao caso da gripe aviária, que em maio derrubou a exportação de frango para mais de 20 países. “O embargo foi enorme, muito maior que o tarifaço. Mas alguém viu o preço do frango cair no supermercado? Se alguém viu, avise o IBGE, porque ele não captou”, brinca.
Para o especialista, seja para cima ou para baixo, as variações de preço no mercado internacional devem ter efeito limitado sobre o consumidor brasileiro.
Fonte: CNN