Projeto utiliza inteligência artificial para monitorar e combater casos graves de dengue
18 de julho de 2025

O Rio Grande do Sul e o Brasil registraram tendência de queda dos casos de dengue neste ano, mas a complexidade no controle da doença cria a demanda para ferramentas avançadas de monitoramento. Vale lembrar que foram mais de 6 mil mortes causadas pela dengue em 2024 no País e um aumento de 400% nos casos registrados naquele ano.
O professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) e membro sênior do IEEE, Márcio Andrey Teixeira, apresenta um uso inédito da inteligência artificial (IA), desenvolvido com a prefeitura de Catanduva (SP), que começa a apresentar soluções concretas para a vigilância e a prevenção da dengue. Com potencial de ser implementado em qualquer cidade brasileira.
“Através da inteligência artificial, estamos desenvolvendo algoritmo para calcular a probabilidade da endemia crescer e virar uma pandemia”, explica Teixeira. Segundo ele, a ferramenta é composta por três módulos: mapeamento de casos, apoio à decisão médica e previsão do agravamento de quadros clínicos.
Mapeamento em tempo real e denúncia de focos
O projeto foi estruturado em três fases. A primeira desenvolveu um mapa interativo dos casos de dengue, atualizado com dados fornecidos pela Secretaria de Saúde de Catanduva. “Segmentamos a cidade por região. Então, as informações que vêm da prefeitura, a respeito dos casos positivos, nós estamos mapeando e separando por setores”, conta Teixeira. O mapa pode ser acessado por meio de um aplicativo, onde a população também poderá denunciar focos do mosquito.
Com isso, a prefeitura passa a ter uma ferramenta de inteligência geográfica. “O município pode olhar esse mapa e saber onde é que ele tem que atacar de forma mais rápida com relação à dengue”, destaca o pesquisador. “E a população ajuda, denunciando novos focos.”
IA que aprende com o passado para proteger o futuro
A segunda fase do projeto introduz o uso de IA para análise de prontuários clínicos — sempre com anonimização conforme a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). “Quando os pacientes chegam numa UPA, por exemplo, eles são obrigados a cadastrar vários tipos de dados: sintomas, comorbidades, tipo sanguíneo. E nós temos acesso se essa pessoa foi internada, se não foi internada, se foi a óbito. Mas lembrando: não temos acesso a nomes”, afirma Teixeira.
Com base nesse banco de dados, a equipe treina a IA para prever a severidade de novos casos. “Pegamos o histórico da cidade, fizemos uma seleção de características e, a partir disso, estamos treinando a IA. O resultado que ela está dando é: essa pessoa tem probabilidade de internar, ser dispensada ou evoluir para um caso grave, com risco de óbito”, explica.
Ele detalha o funcionamento: “É um estudo supervisionado. A gente passa os dados e fala o que aconteceu: essa pessoa tinha tais sintomas e comorbidades, e aconteceu isso. A IA aprende com esses padrões. Por isso, o sistema pode alertar: ‘tome cuidado com essa pessoa aqui porque ela pode virar um quadro sério, com risco de morte’”.
Ferramenta de apoio clínico, não substituição médica
Teixeira deixa claro que a proposta não é substituir a análise médica, mas dar suporte, especialmente para profissionais menos experientes. “Tem muita gente nova, muitos médicos novos, e a dengue também vai além dos sintomas. É muito do feedback, da experiência do médico. Então, essa ferramenta é apenas para auxiliar. Ao invés de dispensar o paciente, ele pode decidir segurar para tratar, por exemplo.”
O projeto foi concebido desde o início com foco na replicabilidade. “Estamos desenvolvendo uma interface, uma documentação, para que qualquer cidade que futuramente queira utilizar o sistema possa usar, desde que tenha os dados que utilizamos”, explica o professor. “Queremos padronizar, para que outras cidades tenham a mesma solução.”
Segundo Teixeira, o aplicativo será lançado no segundo semestre de 2025. Em janeiro, fevereiro e março — período de maior incidência da dengue — o sistema será utilizado de forma plena em Catanduva. “A partir desses resultados, nosso objetivo é que, em maio do ano que vem, possamos disponibilizar essa ferramenta para outras prefeituras. Acreditamos que a demanda será grande.”
Tecnologia adaptável para outras doenças
Embora o foco atual seja a dengue, a estrutura do projeto permite expansão para outras arboviroses. “O secretário de saúde de Catanduva está super feliz. Já está esboçando nossa estrutura para outras doenças, como zika, por exemplo. O segredo de tudo está na base de dados. Desde que existam dados, conseguimos trabalhar.”
Com apoio da Universidade Tecnológica do Texas e uma equipe dedicada de alunos e pesquisadores, o projeto de Teixeira é mais do que uma solução local — é um modelo promissor de como a IA pode ser aplicada de forma ética, inteligente e escalável para transformar a saúde pública.
Fonte: Correio do Povo