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Valioso mel de bracatinga já foi produto de descarte

Agricultura, Agro

09 de junho de 2025

Valioso mel de bracatinga já foi produto de descarte
Alimento produzido na região dos Campos de Cima da Serra, no Rio Grande do Sul, é a mais recente Indicação Geográfica do Estado para um apiário de Cambará do Sul, mas já é oferecido em 15 municípios
foto: Liane Castilhos / Especial

A mais recente indicação geográfica (IGs) obtida pelo Rio Grande do Sul contempla um item que, há aproximadamente duas décadas, era descartado pelos apicultores do Estado, e ainda era chamado, pejorativamente, de “mel de piolho”. Essa situação começou a mudar a partir dos anos 2000, quando um produtor de Santa Catarina enviou amostras do alimento para avaliação na Alemanha. Os resultados apontaram a alta qualidade e sabor privilegiado do agora chamado Mel de Melato de Bracatinga, que logo se tornou, inclusive, um artigo disputado na exportação.

Típico do planalto do sul do país, de onde a árvore bracatinga, ou, cientificamente, a Mimosa scabrella é nativa, o Mel de Melato é oferecido por pelo menos 15 municípios gaúchos (Bom Jesus, Cambará do Sul, Caraá, Itati, Jaquirana, Mampituba, Maquiné, Morrinhos do Sul, Riozinho, Rolante, São Francisco de Paula, São José dos Ausentes, Terra de Areia, Três Cachoeiras e Três Forquilhas), todos incluídos na delimitação da indicação geográfica.

Até o momento, no entanto, somente um empreendimento gaúcho cumpriu os requisitos técnicos para a certificação com o selo de IG, o Apiário Cambará, de Cambará do Sul. A conquista da distinção, em janeiro, contou com a colaboração do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Rio Grande do Sul (Sebrae/RS)Sete propriedades do Paraná e duas de Santa Catarina também contam com a certificação. Ao todo, as 10 empresas produzem 500 toneladas de mel por safra. Somados, são 134 municípios nos três estados do Sul abrangidos pela IG, que começou a ser concedida em julho de 2021. A área total da indicação atinge quase 59 mil quilômetros quadrados.

Segundo o gestor estadual de Indicação Geográfica do Sebrae no Rio Grande do Sul, André Bordignon, o selo de indicação geográfica possibilita, além de um aumento médio de 20% a 50% na valorização do produto certificado, acesso a novos mercados, conexão com o turismo e a proteção da biodiversidade da região.

“A denominação de origem é um tipo de indicação geográfica que visa a assegurar que as características dos produtos se devam exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluídos dos fatores humanos e o saber fazer do território, tornando o produto único. Isso, evidentemente, agrega valor e desperta interesse dos consumidores sobre o terroir”, explica Bordignon.

De acordo com a apicultora Liane Castilhos, responsável pelo Apiário Cambará, a certificação foi um processo bem rápido. “Mas tivemos de aguardar até abril para recebermos os selos”. Na avaliação dela, a IG ainda é pouco conhecida e valorizada entre os produtores. “Muita gente tem resistência”, considera Liane.

A apicultora ressalta ainda que, entre as cerca de 150 famílias ligadas à apicultura no município de Cambará, somente ela tem uma agroindústria para agregar valor ao produto. Liane sucedeu o pai, desde o início dos anos 2020, na administração do empreendimento familiar estabelecido em 1982. Assim como o pai, Liane era fotógrafa profissional, com formação superior, antes de se dedicar plenamente à criação de abelhas e produção de mel, tanto floral quanto de bracatinga.

O apiário da família, atualmente, dispõe de 250 caixas racionais, os compartimentos para acondicionamento de abelhas utilizadas na cultura. Deste total, 30 unidades estão instaladas na propriedade de 25 hectares distante cerca de 14 quilômetros da sede do município. As demais, estão espalhadas na área de três fazendas com as quais Liane Castilhos mantém parceria. “Arrendar espaço em fazendas é muito comum aqui na região”, garante a apicultora do mel raro.

O empreendimento dispõe ainda de loja própria para comercialização. Para tocar o negócio, Liane tem uma colaboradora permanente no local. Na época da safra, entre os meses de janeiro e março, talvez se prolongando até abril, uma pessoa ou duas se somam aos esforços para coleta do mel nas caixas.

“É bem difícil achar quem goste da atividade, o que torna a mão de obra na apicultura bem difícil. Tem de gostar de abelhas, e é no calor, ou seja, é necessário trabalhar sob temperatura de até 40ºC dentro daquela roupa”, revela a empreendedora, referindo-se ao traje de proteção que cobre totalmente o corpo do trabalhador para evitar picadas. As mudanças climáticas, “fazendo frio quando não é preciso fazer frio e calor excessivo”, como diz Liane, têm tornado cada vez mais difícil colher o “mel do cedo”, a partir do final de novembro. Além do impedimento no período temporal, o fenômeno afeta o volume de produção. “Normalmente, seria uns cinco mil quilos (por safra), com uma florada boa. Na última safra, foram 2,5 mil quilos”, calcula a apicultora. O foco principal da produção é o mel – “mel de qualidade”, salienta Liane –, com a cera e o própolis sendo comercializado diretamente com outros produtores. “Uma parte da cera utilizamos para laminar os caixilhos”, explica.

O mel de bracatinga não é a única especialidade do Apiário Cambará. Há também o mel branco, de sabor bastante suave. “No mês de janeiro, temos a floração da carne de vaca, uma árvore lindíssima”, relata Liane, referindo-se ao vegetal que dá origem ao mel branco. Além do que é comercializado na loja própria, a produção do empreendimento é destinada a pontos de venda em Porto Alegre, Bento Gonçalves e Farroupilha, incluindo restaurantes. “Tem muito chef utilizando produtos locais, como o mel, em seus pratos”, afirma Liane.

Fonte: Correio do Povo